Crônicas

terça-feira, 12 de maio de 2015


GENOCÍDIO ARMÊNIO (1915-1918)

Prof Eduardo Simões

         Provocou celeuma, uma declaração recente do Santo Padre, Francisco, sobre um certo genocídio armênio, do qual quase ninguém, em nosso país, já ouviu falar, embora quase todos saibam, lamentem e homenageiem, com justiça, o genocídio dos judeus na Segunda Guerra Mundial, pelos nazistas. Aqueles brasileiros mais bem informados souberam também que, por causa da declaração do Papa, o governante da Turquia, o Primeiro-ministro Recep Tayyip Erdogan, chamou de volta seu embaixador no Vaticano, além de fazer toscas ameaças, dando a todos a primeira pista: os turcos estão envolvidos, e têm “culpa no cartório”.
         Alguns analistas afirmaram que o Papa fez a declaração, interessado em se aproximar mais da Igreja Ortodoxa, inclusive de olho no ramo russo dessa igreja, o mais importante, o qual é preciso aplacar, para facilitar esforços pelo fim da matança na Ucrânia, onde há uma numerosa comunidade católica, e se abram corações e mentes para a possibilidade de convivência entre as duas nações eslavas. Se ele pensou nisso pensou bem.
         Entretanto eu tenho certeza de que ele falousobre isso não só porque houve de fato um genocídio pavoroso, mas, principalmente, porque ele tem certeza que a sua declaração não acarretará nenhum dano imediato aos cristãos que vivem na Turquia, e sobre os quais ele tem responsabilidade, antes que agradar a intelectuais, historiadores ou correntes de pensamento, por mais politicamente corretas que sejam.
Para esclarecer mais a nossos leitores, escreveremos nesse artigo o que a nossa pesquisa nos revelou sobre o Genocídio Armênio.

A Cristianização da Armênia

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Mosteiro de Khor Virap, na Armênia, construído no século XII, no lugar onde, segundo a tradição, o rei Tirídates III atirou Gregorio I o Iluminador em um poço, na época em que aquele ainda era um ardoroso defensor do politeísmo. Nesse buraco, uma espécie de calabouço, Gregório teria vivido 14 anos, e de lá saiu para curar o rei e se tornar patriarca da Armênia. Ao fundo, rodeado de nuvens, o monte Ararat onde, segundo a Bíblia, teria atracado a arva de Noé.


         No tempo da República Romana os armênios constituíam um grande império no leste da atual Turquia, noroeste do Iran, bem no encontro da Europa Oriental com a Ásia. Durante séculos os romanos disputaram com potências locais (Partia e Pérsia), o controle da região, incutindo nela um verniz de cultura ocidental, até que os turcos otomanos, com sua expressão própria do islamismo, a tomaram em 1453, dos bizantinos, e a repartiram, posteriormente com os persas, também islâmicos, mas com uma interepretação também original dessa religião, após longas e sangrentas guerras. A maior parte do antigo território armênio, entretanto, ficou sob controle  turco.
         Muito antes desses acontecimentos, porém, ainda sob o jugo dos romanos, a região recebeu a pregação do cristianismo, segundo uma lenda local, pelas mãos dos apóstolos São Judas Tadeu e São Bartolomeu, mas sem prosperar muito, devido às perseguições dos romanos e dos reis locais, que eram independentes, mas aliados de Roma. Foi apenas em 301, quando um grande santo local, Gregorio I o Iluminador, conseguiu converter o rei Tirídates III, que o cristianismo encontrou campo livre para a sua expansão, ao mesmo tempo em que o rei a tornava religião de estado. A Armênia foi o primeiro estado no mundo a reconhecer o critianismo como religião oficial.
         Entretanto o cristianismo armênio não conseguiu manter seus laços com Roma, rompendo-os, após o Concílio de Calcedônia, em 451, por considerar que aquela estaria acolhendo as teses do bispo hereje Nestorio, que pregava a separação radical das duas naturezas de Cristo: a humana e a divina. Para reforçar a questão da unidade em Cristo, o grupo armênio preferiu radicalizar na direção oposta, segundo a percepção dos Padres da Igreja, excluindo a natureza humana de Cristo. Essa posição é chamada de monofisismo, e ao tomá-la a igreja da Armênia se isolou tanto do cristianismo ocidental romano como das grandes correntes do cristianismo oriental ortodoxo. A Igreja Apostólica da Armênia ficou sozinha, com o seu povo, para enfrentar as agressões de vizinhos antigos e recém-chegados.
         Durante as cruzadas, uma parcela do povo armênio, representada pelo clero do Reino Armênio da Cilícia, achegou-se aos cruzados e reatou ligação com Roma, tornando-se os fundadores da Igreja Católica Armênia, ou católicos de rito armênio, que só ganhou realidade de fato lá pelo ano 1737, quando Abraham PedroI Adzivian foi nomeado patriarca dessa igreja, pelo Papa Bento XIV. Até hoje esse grupo é minoritário, e também sofreu muito com o genocídio de 1915.

Massacres Hamidianos (1894-96, 1909)

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Em grandes salões de luxuosos palácios, os ricos e poderosos da Terra se reúnem a pretexto de “acertar” os destino do mundo moderno. Visão geral da última sessão do Congresso de Berlim, em 1878, onde começou, o flagelo turco-armênio, ditado por interesses estritamente comerciais e geopolíticos estrangeiros. Na primeira fila temos, da esquerda para direita, Alajos Károlyi (da Austria Hungria, se apoiando na cadeira), Alexander Gorchakov (da Rússia, sentado), segurando um braço de Benjamin Disraeli (Reino Unido). Ao centro, de pé, estão Gyula Andrássy (Austria-Hungria), vendo Otto von Bismarck (Alemanha), apertando a mão de Pyotr Shuvalov (Rússia). No canto direito, com barretes vermelhos, os representantes da Turquia;


         Sob o domínio dos sultões turcos, governantes autoritários, despóticos, ou “absolutistas”, mas que tiveram a sabedoria de não colocar a religião como impecilho a ascensão de burocratas competentes, o Império Otomano cresceu, abarcando terras nos três continentes, e, apesar da religião muçulmanda ser oficial, os não muçulmanos, embora tratados como cidadãos de segunda categoria, eram relativamente bem tratadas. Os armênios, por exemplo, formavam uma comunidade muito rica, culta, razoavelmente urbana e influente. Era, decerto, uma proteção de caráter paternalista, sujeita aos sabores de elementos incertos e do humor dos sultões, mas que funcionava, não deixando aflorar grandes diferenças entre os diversos grupos étnicos do Império Turco.
         Entretanto, vigorosa expansão do imperialismo russo, na Europa Oriental e na Ásia, a partir do século XVIII, à custa do Império Turco, fez acender a luz amarela entre as potências ocidentais, principalmente a Inglaterra, que começava a se enriquecer com os tesouros da Índia, e que temiam a formação de um poderoso império, fosse qual fosse, no meio do caminho ou nas fronteiras de sua promissora colônia. Para os ingleses, nessa época, era preferível o Império Turco, decadente, ao Russo, em ascensão.
Os turcos, entretanto, metiam os pés pelas mãos, promovendo grandes massacres contra quem se revoltasse contra sua dominação. Quando essa política foi utilizada para massacrar a população grega, tão valorizada no Ocidente por causa de sua cultura, e que se sublevara em 1821, pela sua independência, o clamor da opinião pública e de grandes intelectuais impediu que as grandes potências ocidentais continuassem desprezando o que acontecia ao sul, nos Balcãs, dando início à chamada Questão do Oriente, da qual a Questão Armênia é subproduto, e na qual se percebe, como poucas vezes na história, o caráter desumano e hipócrita das relações internacionais.
Seria fastidioso descrever aqui todas as tortuosas manobras levadas a cabo pelas potências europeias, a fim resguardar os seus interesses econômicos, em primeiro lugar, a revelia da mais tosca moral e indiferença quanto aos efeitos de suas intervenções para as minorias étnicas do Império Turco, e alhures. Muito superficialmente podemos dizer que, a partir da derrota dos turcos na guerra de independência da Grécia, contra uma coalizão formada por russos, ingleses e franceses – na Guerra da Crimeia, 20 anos depois, ingleses, franceses e turcos se aliarão contra a Rússia – o sultão foi obrigado a fazer uma série de reformas de caráter liberalizante, dando mais direitos às minorias do Império, entre estas os armênios, ricos, cultos e mobilizados na luta pela sua causa.
Aos ingleses interessava “abrir” a sociedade turca para os influxos do capitalismo, seguindo o modelo cultural das sociedades capitalistas ocidentais, inclusive no campo da tolerância religiosa. Em 1831, o sultão reconhece a Igreja Católica Armênia, e em 1834 a Igreja Evangélica (protestante) Armênia. Diplomatas e missionários vindo da Europa e Estados Unidos começam a “invadir” o império. O serviço militar torna-se obrigatório, todos devem se prestar a proteger as propriedades dos mais ricos, com grande prejuízo para os pobres camponeses muçulmanos, que viam seus filhos serem mobilizados e morrerem em guerras tão frequentes quanto evitáveis, perdendo uma valiosa mão-de-obra. Os armênios, proporcionalmente mais ricos, livram seus filhos do serviço militar e da guerra, pagando elevadas quantias, previstas na lei, para alguém se safar do serviço militar. Ótimo para o Estado e seus parasitas, péssimo para os mais pobres.
A imposição do liberalismo, juridicamente igualitarista, numa sociedade ainda marcada por relações de caráter tribal e de paternalismo despótico, fez ressaltar entre os diversos grupos étnicos as diferenças que antes havia, e que eram ocultas pelo personalismo dos sultões. Os muçulmanos mais pobres ficaram desalentados, afinal já não podiam “jogar na cara”, ou ao menos se sentirem de fato, cidadãos superiores em relação aos não-muçulmanos, como pregava a interpretação tradicional da lei islâmica, ficando, de fato, em uma situação de inferioridade social em relação aos ricos cristãos, afinal era uma ordem capitalista,e isso acirrou os ressentimentos étnicos. Para piorar ao longo de todo o século XIX as potências ocidentais só fizeram estimular o nacionalismo armênio, por causa do aspecto religioso, que teimava em subsisitir sob a capa dos interesses econômicos, inclusive fornecendo passaportes aos armênios da Turquia, que os tornava cidadãos de categoria superior, inclusive diante dos muçulmanos. Por causa disso a má vontade das autoridades turcas frente às demandas dos armênios só fez aumentar, aumentando, por sua vez, a insatisfação destes, num ciclo vicioso sem começo e sem um bom fim previsível.
Açodados pelos estrangeiros, jovens intelectuais armênios se deixaram levar pelas promessas da nações ocidentais, pelo nacionalismo belicista da burguesia europeia, e pelo imenso preconceito com que esta tratava os turcos – na alta esfera da política internacional europeia, o Império Turco era tratado como o “homem doente da Europa”, expressão cunhada em 1853 pelo tzar Nicolau |. Em 1885, um grupo desses jovens “sonhadores” fundou, em Paris, um partido que pregava abertamente o enfrentamento ao estado turco, e até a formação de um país armênio autônomo, “na lei ou na marra”. E passaram à ação criando toda sorte de mobilizações, greves, a até ataques a órgãos públicos, chegando ao extremo de atacar populações islâmicas.
Paralelo a isso, bandos de assaltantes de povos tribais kurdos e circassianos, armados pelo governo, como se fora um exército irregular, aproveitando-se do abandono das províncias orientais, começaram a saquear povoados armênios. Ante a impotência ou indiferença do poder central, organizações armênias de defesa se armaram começaram a revidar aos ataques.
O sultão Abdul Hamid II, um homem enrustido e paranoide – vivia isolado, pois tinha medo obsessivo de uma traição – reforçado pela da aliança com os alemães, além de contar outros apoios internacionais estratégicos, resolveu “apelar para a ignorância”, e ao invés de punir os responsáveis pelos crimes que o incomodavam, resolveu dar uma lição em toda comunidade armênia, armando civis e liberando forças turcas, além das temíveis tropas irregulares, para realizar um massacre geral, tipo “dar uma lição” nas áreas de população armênia, entre os anos de 1894 e 1896. Foi um desastre: o cálculo dos mortos, todos civis, com muitas mulheres e crianças, gira em torno de uns 88 mil mortos pelas armas e uns 100 mil pela fome; 546 mil foram expulsos de suas terras, 649 igrejas e mosteiros foram profanados, 324 delas foram transformadas em mesquitas, etc. Os assírios, também cristianizados, foram arrolados nos massacres e 25 mil deles morreram. Incapaz de separar a religião do estado, o homem turco comum associava a religião dominante nos países europeus, o cristianismo, às políticas implementadas por seus respectivos governos, e suspeitava dos cristãos dentro de seu país.
Esses ataques renderam a Abdul Hamid II ataques intensos pela imprensa europeia e norte-americana, e o afastou dos turcos liberais, abrindo espaço para que um grupo político novo na Turquia, os Jovens Turcos, desferisse um golpe de estado, em julho de 1908, forçando-o a cumprir a constituição liberal de 1876, que ele publicamente ignorava. Nesse primeiro momento os armênios conseguiram avanços, inclusive o direito de formar milícias locais armadas, o que cheirou como provocação e humilhação aos funcionários e militares leais do velho Hamid, que, aproveitando-se de um momento de fraqueza política dos Jovens Turcos, assumiu ditatorialmente o estado e incitou a população muçulmana, com um apelos religiosos, a atacar a população cristã armenia da cidade de Adana e arredores, em abril de 1909. Turcos muçulmanos atenderam em massa ao pedido, e mataram indiscriminadamente a umas 30 mil pessoas, inclusive missionários cristãos estrangeiros, católicos e protestantes.
Nova rodada de acusações pela imprensa, novas pressões diplomáticas, e Abdul Hamid II é deposto em um golpe incruento pelos Jovens Turcos, sendo substituído pelo seu irmão, o sultão Mehmed V, mas a sua vinculação a esses trágicos episódios não será esquecida, que passarão à história como o nome de massacres hamidianos.

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Aqui sobrou a dignidade que faltou lá. Segundo a foto, esse velho, rústico e pobre camponês turco muçulmano, Haji Agha, sentou-se à entrada de um hospital, onde estavam mulheres e crianças armênias, para protegê-las da fúria das multidões, em 1895

A Reação das Grandes Potências     

         Em 26 de agosto de 1896,exasperados pela imobolidade das potências europeias frente aos massacres do sultão Hamid II, um grupo de 28 armênios, homens e mulheres, portando armas invadiu a sede do Banco Otomano, de capital majoritariamente inglês, em Constantinopla, para chamar a atenção do que acontecia dentro do país e, quem sabe, forçar uma intervenção externa. A ocupação durou 14 horas e resultou na morte de 10 armênios e policiais turcos. No interior a população turca, enfurecida e insuflada pelas autoridades, atacou a matou pelo menos uns 6 mil armênios. Nenhuma potência se mexeu. O máximo que eles conseguiram foi um salvo-conduto, e a garantia de asilo na França.
Afinal o que queriam as grandes potências, que por tanto tempo forcejaram junto ao sultão para dar mais direitos e liberdades às populações cristãs da Turquia, e por que nada fizeram para proteger essa população, que eles tanto excitaram?
         A menção de aspectos religiosos em acordos firmados por países que só conheciam interesses econômicos, se prendia ao fato esse assunto sempre era levantado pelos russos, granjeando-lhes muita simpatias na região, sob a alegação de que a eles, os russos, cabia a tarefa de proteger populações cristãs, como que para justificar a sua expansão na área, sem falar que para essas populações, tanto cristãs como muçulmanas, esse apelo fazia muito sentido. Mas a posição dos russos era tão hipócrita como a dos outros.
         A posição inglesa: para os ingleses tratava-se, antes de tudo, de impedir o excessivo crescimento da Rússia nessa região, principalmente após o ano de 1875, quando os ingleses compraram o controle do Canal de Suez, uma rota vital para o seu comércio com o Extremo Oriente. Uma grande potência poderosa, próxima a Suez, seria intolerável. Para os ingleses era preferível uma Turquia fraca, mas não morta, e os ingleses achavam que esta já estava fraca o suficiente. Dito de outra maneira, os ingleses ora empurravam ora amparavam ao “homem doente da Europa”, e, embora internamente tenham se levantados muitas e importantes vozes contra os massacres e o tratamento dado aos armênios, o país nada fez. Um dos principais políticos da época Lloyd George, em sua autobiografia, acusa formalmente a política externa de seu país para a região, de ser o principal responsável por todos os massacres, e por fim o genocídio, sofridos pelos armênios. A posição inglesa era “sim e não”, de acordo com as conveniências...
         A posição russa: O grande Império Russo, especialista em aplicar derrotas esmagadoras aos turcos, e que, no discurso, se dizia protetor das populações cristãs do Oriente, temia a criação de um estado armênio em suas fronteiras ainda não consolidadas, que pudesse, inclusive, estimular desejos de autonomia por parte de outros povos do império. Nesse caso a sua política foi de estimular, mas sem se meter, o conflito entre turcos e armênios, que, afinal, enfraqueceria os dois, ambos considerados como obstáculos à sua expansão. O posição russa era: “que se matem os dois!”
         A posição francesa: mantendo laços estreitos com a Turquia, desde o século XVI, a França detinha uma posição excepcional dentro do país, comercialmente muito vantajosa, e não queria perder isso por nada, principalmente agora que a Alemanha se tornava cada vez mais próxima da Sublime Porta (outro nome da Turquia). O governo e a burguesia da França, apesar da retórica oficial, e do clamor da imprensa, não queriam nem saber de confrontar essa “mina de ouro”, ainda mais porque Abdul-Hamid II lhes fora muito favorável. A posição dos franceses era “elas [as riquezas turcas] são minhas; ninguém tasca, eu vi primeiro”
         A posição da Áustria-Hungria: tradicionais inimigos dos turcos, os austro-húngaros, como os russos, temiam o contágio das disputas nacionais internas na Turquia, e temia ser a próxima a se contagiar, já que havia inúmeras etnias no seu território que poderiam buscar autonomia, a exemplo dos armênios. A posição dos austro-húngaros era: “já que eu estou tão doente quanto eles [os turcos], é melhor lhes dar uma mãozinha”.
         A posição dos alemães: o chanceler von Bismarck julgava que os alemães nada tinha a ganhar com os problemas da Turquia, por isso pregava a indiferença. Com a ascensão de Gilherme II, em 1888, e sua temerária política internacional, sem falar do crescimento dos interesses comerciais alemães na região, e coisa desandou tanto, que o kaiser simplesmente “adotou” aos turcos, provavelmente querendo usá-los contra o expansionismo russo-eslavo, chegando ao ponto de ordenar que todos os seus agentes de corpos diplomáticos na Europa e na Turquia ficassem de olho nas organizações armênias, e transmitissem toda informação colhida direto ao sultão, acirando a sua paranoia persecutória, sem falar do absurdo de transformar embaixadores e cônsules alemães em agentes da polícia secreta turca! Há indícios de que alemães e austríacos, inclusive, deram apoio logístico e tecnológico ao genocídio de 1915, algo reconhecido pelo atual presidente da Alemanha. A posição dos alemães era: “quem tocar neles [nos turcos], eu atiro!”

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Eis o resultado das declarações solenes do Congresso de Berlim. O que sobrou de uma próspera família armênia, em 1899.
        
Os Anjos da Morte

         O governo despótico e personalista dos sultões estava levando o país ao descrédito mundial, enquanto acelerava a rápida decadência de um poderoso império. Contra essa tendência, levantou-se um amplo movimento nas elites, conhecido como Jovens Turcos, iniciado, não por coincidência, em julho de 1889, cem anos após a revolução francesa.
         Esse movimento de caráter ‘progressista’, ‘modernizador’, ‘liberal’, burguês, empolgou amplas parcelas da população turca e não turca, como os cristãos armênios, que viam na modernização do país, uma chance de relações mais igualitárias com a maioria muçulmana, e o fim dos entraves o seu progresso social e econômico numa sociedade que se complexificava, e que precisa de reforma urgente, para não ‘cair de podre’. Entretanto o movimento dos jovens turcos tinha problemas:
         a) Não era homogêneo, dividindo portanto em facções com visões diferentes.
         b) Procurava copiar a experiência burguesa-capitalista do Ocidente, em uma realidade bem diferente, sem aquilatar bem o que deveria ser conservado e o que deveria ser descartado, criando uma espécie de Frankenstein político-social, muito avançado em algumas coisas e muito atrasado em outras, que quase destruiu a todos.
         c) A enorme dependência do movimento às forças armadas, e o seu caráter secreto, no estilo da maçonaria, o que denunciava o seu caráter golpista e ditatorial.
         Chegados ao poder em 1908, os Jovens Turcos começaram a implementar as suas reformas, e, de fato, algumas foram benéficas e modernizadoras, como, por exemplo, obrigar o sultão a cumprir a constituição liberal de 1876. De fato, era uma modernização burguesa-liberal que, naquele tempo também queria dizer uma coisa: qualquer minoria que se torne obstáculo ao ‘progresso’, na visão da maioria, deve ser atropelada, para o bem dessa maioria, agravada pela propenção à violência em uma sociedade ainda com ranços de despotismo e tribalismo arcaicos.
         Em 1909, após uma tentativa de golpe do sultão, os Jovens Turcos depõem a Abdul Hamid II. Com a deposição do sultão de fato, o país ganhou um sultão formal, Mehmed V, e passou a ser governado, de fato, por um triunvirato formado pelo Ministro do Interior, Talat Paxá, o da Guerra, Enver Ismail (Enver Paxá) e o da Marinha Djemal Paxá – os “Três Paxás” – vinculados ao Comitè de União e Progresso, a facção mais nacionalista dos Jovens Turcos, que aproximaram a Turquia ainda mais da Alemanha, e ao lado desta entraram na Primeira Guerra Mundial.
Foram eles, os principais mentores do genocídio armênio de 1915.

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O enganador: oriundo de família abastada, Talaat Paxá, recebe formação esmerada, ocidentalizante, entrando para a franco-maçonaria turca, da qual se tornará Grão-Mestre, onde ganha gosto para reuniões secretas e intentos encobertos. Como Ministro do Interior e membro da trinca que governava, de fato, o país, de 1909 a 1918, coube a ele a maior parte das iniciativas de logística e execução, que levaram ao genocídio de 1915-1918. Enquanto este estava em andamento, era ele quem vinha a público tranquilizar autoridades estrangeiras e a opinião publica internacional, ora garantindo que nada estava ocorrendo, ora justificando qualquer massacre que vazasse, a pretexto que era fruto do ódio comum duas etnias, quando não dizia que eram os armênios que atacavam os turcos – houve casos em que armênios feridos, ou mortos, foram apresentados a representantes estrangeiros como sendo turcos muçulmanos. Talat Paxá foi assassinado, em março de 1921, em Berlim, pelas mãos de um armênio vinculado a uma organização secreta, criada eliminar os autores do genocidio, depois que se viu que nada seria feito contra eles. Na República Turca, ele é tratado como um herói, sepultado no imponente Monumento da Liberdade, em Istambul, e uma importante rodovia foi inaugurada com o seu nome.

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O incompetente sanguinário: oriundo da classe média, Djemal Paxá ingressou na carreira militar e ganhou os mais elevados postos, graças à sua adesão aos  Jovens Turcos. Durante a guerra ele ficou famoso por três coisas: a forma cruel com que reprimiu todas as revoltas contra o domínio turco, sendo conhecido, pelos árabes, como “semeador sangrento”; as derrotas esmagadoras que sofreu, e que desmoralizaram generalato turco, a ponto de os alemães assumirem o comando das principais tropas do país – a maior vitória dos turcos na guerra, Galipoli, em 1916, foi conseguida sob comando alemão; e às negociações secretas que travou com os aliados, já em 1915, quando viu que a guerra se encaminhava para um impasse. Ou seja, um traidor. No fim da guerra ele fugiu, com outros, para a Alemanha e a Suíça. O braço dos vingadores armênios o alcançou, em julho de 1922, em Tifflis, na Georgia. Nem os turcos o aguentaram, e ele ficou fopra do Monumento da Liberdade

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O dissimulado: filho de uma família rica e importante, ele fez boa parte de sua formação militar na Alemanha, onde aprendeu a admirar o belicismo típico desse país, nessa fase da sua história. Coube a ele dar o pretexto para o genocídio armênio, ao alegar, falsamente, que a estrondosa derrota turca em Sarikamish se deveu à traição de armênios. Como Djemal, em diversas oportunidades ele deu mostras de não estar preparado para a carreira militar, com graves prejuízos à condução da guerra pelo seu país, e assim que a Turquia foi derrotada ele emigrou para a Rússia, onde fingiu estar ao lado dos comunistas, na guerra civil que se seguiu à revolução russa de 1917, propondo-se a apoiar os bolcheviques para conquistar as populações de fala turca do império russo. Porém, mais tarde, passou para o lado oposto, tentando justamente levantar essas populações contra os revolucionários, e foi por eles mortos em uma batalha acontecida perto de Dushanbe, capital no Tajikistão, quando suas tropas foram pegas de surpresa, em 1922. Em 1996, seu corpo foi trasladado para o Monumento da Liberdade.   


O Genocídio de 1915
        
         Hà informações que em 1910, num encontro ocorrido em Salônica, de 31 de agosto a 14 de setembro, a cúpula do Comitê de União e Progresso, na pessoa de Talat Paxá teria feito a seguinte declaração: “Em virtude dos direitos outorgados pela Constituição [a de 1876, que os Jovens Turcos haviam feito o sultão jurar], se estabeleceu a igualdade entre cristãos e muçulmanos... mas esse é um, ideal irrealizável. Ante a Sharia [tradição islâmica], ante nossa história e os sentimentos de centenas de milhares de nossos irmãos muçulmanos, os cristãos se comprazem em opor-se aos nossos intentos de otomanização e representam uma muralha intransponível para a igualdade jurídica [só possível, na visão dele, entre os que têm a mesma religião, logos eles, que propunham libertar o Estado e a sociedade civil da tutela estrita da religião]... Portanto não pode haver uma verdadeira igualdade, enquanto não otomanizarmos o Império... Hoje, só nos resta um meio: aniquilá-los [aos povos cristãos] pela força das armas... [conclusão] Adotar uma política centralizadora e impor o panturquismo, recorrendo, caso necessário, ao extermínio dos dissidentes” (Ohanian, Pacual; La Cuestión Armenia y las relaciones internacionales (1897-1914); tomo 2; Cuchara de Hierro; Buenos Aires; 1982; pg 258). Estava plenamente justificadao e esboçado o futuro genocídio; só faltava um pretexto.
         Com o início da Primeira Guerra Mundial, reiniciaram-se as hostilidades entre turcos e russos, tanto no Mar negro como no Cáucaso, onde vários grupos de voluntários armênios se agregaram, tanto ao exército turco como ao russo. No final de 1914, um grande exército turco foi enviado para retomar vários territórios perdidos na guerra de 1877-78, e repelir os russos que avançavam no Cáucaso. Ignorando o conselho de experientes assessores alemães, o general Enver Paxá, atirou suas tropas desordenadamente contra os russos, colhendo, em 4 de janeiro de 1915, uma das mais acachapantes derrotas da histórias do exército turco. Enver, porém, não se dá por ‘vencido’, e, chegando a Istambul, faz espalhar a notícia de que a derrota só acontecera por causa da traição generalizada dos armênios. Esse era o pretexto ansiado. E assim foi-se criando, por meio dos órgãos de imprensa, alimentados por informes falsos e alarmistas, um clima anti-armenio, intoxicante, no seio da população.
         Gradualmente o governo começa a mobilizar as forças irregulares de tribos curdas e circassianas, além de voluntários turcos, açulados pela autorização de saquear impunemente a grande riqueza dos armênios, além de abusar sem receio de suas mulheres e crianças, sendo inclusive adicionada a essas forças uma outra, composta por uns 12 mil perigosos presos comuns, libertados só para isso. O massacre teve início no dia 24 de abril, com o aprisionamento, em Istambul, da mais ilustre elite intelectual armênia, o indício mais certo de genocídio, seguido de diversas outras prisões que só se justificariam num quadro de genocídio premeditado. Ao todo foram 196 escritores, 168 pintores, 575 músicos, compositores e bailarinos, 176 professores, 160 advogados, 336 médicos, 62 arquitetos, 64 atores, etc. Eles foram levados para prisões onde sofreram tortura diversas e estupros, sendo sumariamente julgados e excutados por fuzilamento, decapitação, degola, etc. A partir daí foi uma bestialidade só.
         Não vou entrar em detalhes sobre as diversas etapas e fatos isolados do genocídio, já há muitos dados sobre isso na Internet, mas de uma maneira geral podemos dizer que carecia aos turcos os meios técnicos e uma cultura industrialista avançada o bastante para dar um aspecto mais asséptico e industrial, à matança, como os nazistas fizeram na Segunda Guerra, com os seus prisioneiros. O genocídio armênio foi artesanal, fruto de uma mobilização nacional, e por isso abundam, escandalosdamente, testemunhos e fotos, absurdas, impressionantes. Mais uma vez recomendo a Internet.
Entre os métodos de matança coletiva um dos mais usados era reunir a população de uma vila em um prédio grande, por exemplo uma igreja, e tocar fogo em todos (homens, mulheres e crianças). Há relato de militares turcos que, muitos bandidos, soltos para o massacre, enlouqueceram após assistir a esse tipo de execução tão bárbara.
Outro método, usado principalmente contra mulheres e crianças, era lotar um barco com eles e ir avançar até uma boa distância da praia ou da margem de um rio, e atirá-los às águas.
Havia o uso de agentes químicos, aplicado principalmente por médicos turcos. Há informes de que muitas crianças foram mortas com a aplicação de morfina na veia, como teria acontecido no Hospital do Crescente Vermelho de Trebizonda. Crianças também teriam sido mortas nesse mesmo hospital com o uso de gás tóxico. Por fim havia a inoculação de vírus de febre tifoide – um caso notável foi o do doutor Tevfik Rüstü Aras, que ficou famoso por fornecer atestados falsos para as mortes de crianças, e de ser muito eficiente na tarefa de destruir os cadáveres por meio de agentes químicos. Por essa ação ele foi nomeado membro da Alta Comissão de Saúde, em 1918; nesse mesmo ano casou com uma jornalista, filha de família riquíssima; em 1920 se torna um dos fundadores do Partido Comunista Turco; e mais tarde ministro das Relações Exteriores de 1925 a 38. Morreu em 1972, em Istambul
Houve também a obrigação repentina de numerosas populações armênias, em diversas aldeias e cidades, de abandonar os seus lares, que foram imediatametne saqueados e posteriormente vendidos a turcos, saindo só com o que podiam carregar, para serem transferidos para outras regiões do Império. Essa medida de deportação e “confisco” foi, inclusive, aprovada pelo parlamento turco, em 13 de setembro de 1915. A maior parte dos armênios foi remetida para o escaldante deserto da Síria, numa siutação triplamente maldosa
a) Não se tratou de propriciar o mínimo de condições para a viagem, feita a pé ou em comboios de trens apropriados para animais. Esses deslocamentos foram levados a efeito, de propósito, em pleno inverso, que é rigoroso nessa região, sem que os deportados tivessem o menor assistência, antes o contrário. Mulheres, crianças e velhos, morreram como moscas de frio, fome, estresse e doenças do aparelho respiratório. Durante as marchas, os soldados turcos que escoltavam os deportados, não só não os protegerem do ataque de grupos islâmicos empedernidos, turcos ou de outra nacionalidade, como participaram ativamente dos roubos, estupros e assassinatos que se cometeram. Essas eram as “Marchas da Fome”.
b) Não foi preparada nenhuma estrutura para receber os imigrantes. Foram simplesmente abandonados ao deserto. Milhares de corpos de armênios ficaram espalhados pelas estradas. Os sobreviventes apresentavam um estado de inanição extrema.
c) Essa população, há milênios, mora em reigiões montanhosas frias, e estavam fisicamente muito adpatados ao frio. Expostos ao calor da Síria o organismo de muitos colapsou, situação essa agravada pela falta de comida, água e cuidados médicos. Quem não morreu por causa desses gravames foi trucidada pelos agentes do governo turco, e por bandidos que agiam em seu nome.
Além disso foi aberta uma rede de campos de extermínio, onde populações armênias eram internados e induzidas à morte por maus tratos, fome, sede e falta de cuidados médicos. O seu chefe geral era Sukru Kaya, braço direito de Talat Paxá, que pregava abertametne o extermínio dos armênios, usando um termo que ficará famoso, 30 anos mais tarde, por causa dos nazistas: “solução final”. Sukru fugirá do julgamento e dos esqudrões armênios e se tornará ministro de trâs pastas diferentes, entre 1924 e 1938, e morrerá em 1959, na Turquia.
E quais eram as alternativas ao massacre? As crianças de doze anos deveriam ser entregues a conventos de monges muçulmanos, os dervixes, para serem educadas na religião islâmica estrita; as mulheres poderiam se salvar desde que se dispusessem a se oferecer como escravas sexuais em praça pública; as famílias que se convertessem em massa ao islamismo também seriam poupadas.

Paródia Negacionista

         Com o fim da guerra, os turcos mais inteligentes puderam ver a que as palavras dos Jovens Turcos não se coadunavam com os efeitos de sua permanência no poder, que foram vítimas de propaganda enganosa. O país fora derrotado na guerra, e o que restava do império estava perdido. No embalo do caos político, que se seguiu à derrota turca, e o espírito de revanche tanto das potências aliadas como do último dos sultões, foi convocada uma corte marcial, em 1919, para julgar os culpados do genocídio, já amplamente denunciado e conhecido.
         Foi uma “encenação”. As provas eram abundantes, e até pena de morte foi propalada contra os três paxás, e outros importantes funcionários, mas nada acontecia, principalmente por causa do avanço das forças republicanas de Kemal Ataturk, e as protelações demarches se tornaram tão escandalosas, que tropas do inglesas foram até as prisões de Ancara, e tomaram, à força, a custodia dos principais envolvidos, levando-os para a ilha de Malta, a fim de submetê-los a um julgamento internacional, minimamente sério. Mas foi em vão, o governo republicano de Kemal Ataturk, um simpatizante dos Jovens Turcos, agora no poder,  simplesmente destruiu as provas e inviabilizou a julgamento. Sem as provas e temendo a expansão do comunismo na Rússia, os ingleses preferiram libertar os genocidas.
Esses homens, então, retornaram à Turquia, onde foram tratados como herois e beneméritos, e a eles entregue o comando cultural da nova República da Turquia, firmemente baseada na negação absoluta de que tenha havido um genocídio, sequer uma matança covarde e generalizada, em seu território. Eis o que diz um trecho do bem artigo sobre o genocídio armênio, na Wikipedia francesa: “nos primeiros anos da república turca [fundada com a queda do último sultão, por Kemal Ataturk], os exilados de Malta são nomeados a postos governamentais, como Primeiros-ministros... ministros... governadores, membros do parlamento, generais das forças armadas. Eles se tornaram o núcleo da elite intelectual turca, e seus descendentes ocupam os mais altos postos, até os dias de hoje”. Precisa-se dizer mais.  .
         Atualmente, na Turquia do Primeiro-ministro Recep Tayyip Erdogan, a simples menção ao genocído armênio, pode acarretar pena de prisão por até quinze anos, quando não acontece coisa pior, como quando do assassinato de Hrant Dink, editor de um jornal armênio, em 2007, um lutador pelo reconhecimento do genocidio. Os tribunais do país estão proibidos, por lei, de receber qualquer demanda a respeito do genocídio. Em 2014, não podendo mais deter a pressão mundial, sempre crescente em prol do reconhecimento desse genocídio, Erdogan mandou uma mensagem de condolências ao governo da Armênia, algo ainda meramente protocolar.
         Gradualmente os intelectuais e a classe média turcos forçam uma mudança nessa atitude absurda, como a escritora turca Fethie Çetin, que descobriu ser sua avó uma sobevivente desse genocídio, havendo ainda a suspeita de que a filha adotiva de Ataturk, Sabiha Goksen, um modelo para a nova mulher turca, seria de ascendência armênia, filha de uma das sobreviventes do holocausto.
          Um grande golpe para a versão turca do episódio, entretanto, veio de seus mais fieis colaboradores e executores diretos do genocídio: os curdos, um povo muçulmano, que hoje sofre violências dos turcos em sua luta por autonomia. Pois bem, várias de suas organizações e personalidades mais conhecidos vieram a público reconhecer e denunciar a existencia do genocidio, além se desculpar por sua participação nele.
         Existe na Wikipedia em inglês uma página extensa, enumerando testemunhas e transcrevendo parte de suas impressões sobre esse genocidio, no seguinte endereço: http://en.wikipedia.org/wiki/Witnesses_and_testimonies_of_the_Armenian_Genocide
         Os turcos, tão zelosos em praticar, e depois esconder, esse genocídio, seguem, entretanto, marcados por esse... genocídio. Fechadas as portas da União Europeia, inclusive por causa de sua política negacionista, o país voltou-se para o Oriente Médio, visando disputar o controle de uma região então rica e estratégica, com a Arabia Saudita e o Iran, mas agora eles sabem que a única coisa que lhes restará, se vencerem essa disputa, será uma espantosa massa falida, deixada após a passagem do grupo genocida Estado Islâmico, cem anos após os turcos inaugurarem esse tipo de violência na região, só que agora voltada contra os próprios muçulmanos. É como aquela bruxa que não existe, mas vive aparecendo

http://ivarfjeld.files.wordpress.com/2013/02/obama-netanyahu-2.jpg
http://www.4thmedia.org/

         O cúmulo da hipocrisia ou a certeza de outros genocidios: não existem países mais zelosos pelo reconhecimento do genocídio judeu, que Estados Unidos e Israel. Quem disser que não houve genocídio judeu na Segunda Guerra é imediatamente taxado pelos representantes destes países como terrorista ou antissemita. Pois bem, todos os dois desconhecem oficialmente o genocídio armênio. Os Estados Unidos, assim como a Inglaterra, usam da Turquia, antes para conter o comunismo e agora para conter a Rússia, e sustentam essa imoralidade, apesar de a maioria esmagadora dos estados americanos, 44, reconhecerem e deplorarem esse massacre. O cinismo oficial dos Estados Unidos é tamanho, que a ex-secretparia de estado, Hillary Clinton, chegou a firmar que a condenação do massacre armênio implicaria nem constrangimento ao direito de expressão daqueles que o negam (http://www.firstthings.com/web-exclusives/2015/04/when-we-cared).
Israel, por sua vez, mantém ótimas relações comerciais com os turcos, portanto...


http://msalx.veja.abril.com.br/2014/08/08/1958/pe6Cx/ira-lula-ahmadinejad-erdogan-afp-620-original.jpeg?1402458862
http://veja.abril.com.br/

         Tudo é motivo de alegria na cúpula do negacionismo. Da esquerda para direita: Lula (Brasil), armênios; Ahmadinejad (Iran), armênios e judeus; Tayyip Erdogan (Turquia), armênios. A posição do Brasil é esdrúxula, como em outras coisas mais, pois o Mercosul reconhece o genocídio. Dos estados brasileiros, as assembleias legislativas de apenas três reconhecem o genocídio.